História das mulheres na diplomacia brasileira é tema de documentário disponível a partir de hoje na web

8 de março de 2019
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“Exteriores” foi produzido como celebração do centenário de ingresso na carreira diplomática de Maria José de Castro Rebello Mendes, a primeira diplomata brasileira e a primeira mulher a prestar concurso público no país.

Por Bruno Leal | Agência Café História

“Não sei se as mulheres desempenhariam com proveito a diplomacia, onde tantos atributos de discrição e competência são exigidos, (…) e se a requerente está aparelhada para disputar um lugar nessa Secretaria de Estado (…) Melhor seria, certamente, para o seu prestígio, que continuassem a direção do lar, tais são os desenganos da vida pública, mas não há como recusar a sua aspiração, desde que disso careçam e que fiquem provadas suas aptidões.”

Essas palavras estão em um despacho escrito em agosto de 1918 por Nilo Peçanha, então Ministro das Relações Exteriores (1917-1918). Apesar do machismo e do preconceito evidentes no documento, Peçanha permitiu que Maria José de Castro Rebello Mendes ingressasse naquele ano na carreira diplomática, tornando-se a primeira diplomata do país. Com essas palavras começa também o documentário “Exteriores – Mulheres Brasileiras na Diplomacia”, lançado ano passado e que a partir de hoje, Dia Internacional da Mulher, pode ser visto por qualquer pessoa na plataforma vimeo

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Diplomata Irene Vida Gala sendo entrevistada para “Exteriores – Mulheres Brasileiras na diplomacia”

Dirigido por Ivana Diniz e com roteiro de Ana Beatriz Nogueira, “Exteriores” é a realização do Grupo de Mulheres Diplomatas, coletivo criado em 2013 e que hoje reúne mais de um terço das diplomatas brasileiras. O documentário de 53 minutos foi produzido como celebração do centenário de ingresso na carreira diplomática de Maria José de Castro Rebello Mendes, que foi não somente a primeira diplomata brasileira, mas também a primeira mulher a prestar concurso público no país.

“Exteriores” só foi possível graças a um projeto coletivo de financiamento realizado no site Kickante, e a ajuda da Associação dos Diplomatas Brasileiros (ADB Sindical). A mobilização foi tão grande no ano passado, quando a arrecadação foi feita, que o projeto angariou R$ 31.425,00, quase quatro mil reais acima do montante estipulado pelos produtores do longa. No total, 105 pessoas contribuíram por meio da internet.

O debate sobre a presença feminina no Ministério das Relações Exteriores é feito no documentário a partir de uma grande riqueza de dados históricos, relatos biográficos, imagens de arquivo, depoimentos de mulheres diplomatas em vários estágios da carreira e tabulação de dados sobre mulheres na diplomacia brasileira.

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Cartaz do filme, lançado ano passado e que agora está na internet, gratuitamente

Segundo levantamento realizado pelo portal Metrópoles, “Em 2017, o concurso de admissão à carreira diplomática teve percentual recorde de aprovação. Entretanto, mesmo com esses avanços, as 360 mulheres diplomatas no Brasil ainda representam apenas 23% dos profissionais de diplomacia do país.”

Pesquisa

A parte histórica do documentário se beneficiou da pesquisa de Guilherme Friaça, publicada em agosto de 2018 pela FUNAG: “Mulheres Diplomatas no Itamaraty, 1918-2011 – Uma Análise de Trajetórias, Vitórias e Desafios”(baixe gratuitamente aqui). Na obra, Friaça resgata a história das primeiras diplomatas, apresentando trajetórias até então invisibilizadas numa instituição onde o cânone costuma ser exclusivamente masculino.

A outra inspiração foi o documentário sobre as diplomatas francesas, “Par Une Porte Entreouverte”, produzido pelo Quai D’Orsay em 2017. Ele acendeu nas integrantes do Grupo de Mulheres Diplomatas o desejo de também apresentarmos ao público a nossa trajetória e os nossos desafios.

Mulheres na tela

Além de Maria José de Castro Rebello Mendes, a primeira diplomata, o documentário fala de Odette de Carvalho Souza, a primeira embaixadora brasileira e a primeira embaixadora de carreira do mundo, e de Maria Sandra Cordeiro de Mello, a primeira aluna do Instituto Rio Branco. O filme também trata da história de Mônica de Menezes Campos, a primeira diplomata negra, falecida precocemente em 1985 de um aneurisma cerebral. Aprovada em 1978, à época ela foi celebrada como símbolo e arauto de alegados “avanços” no Itamaraty – mas, depois, foi totalmente esquecida. No documentário, Diniz entrevistou a irmã de Mônica, Márcia de Menezes Campos.

As demais entrevistadas para o documentário são as embaixadoras Vitória Cleaver, Thereza Quintella, Edileuza Fontenelle, Maria Nazareth Farani, Eugenia Barthelmess, Irene Vida Gala, Sônia Gomes e Gisela Padovan; as conselheiras Marise Nogueira e Viviane Balbino; as secretárias Amena Yassine e Laura Delamonica.

Como citar esta notícia

CARVALHO, Bruno Leal Pastor de. História das mulheres na diplomacia brasileira é tema de documentário disponível a partir de hoje na web (notícia). In: Café História – História feita com cliques. Disponível em: https://www.cafehistoria.com.br/exteriores-mulheres-na-diplomacia/. Publicado em: 8 mar. 2019.

Bruno Leal

Fundador e editor do Café História. É professor adjunto de História Contemporânea do Departamento de História da Universidade de Brasília (UnB). Doutor em História Social. Tem pós-doutorado em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pesquisa História Pública, História Digital e Divulgação Científica. Também desenvolve pesquisas sobre crimes nazistas e justiça no pós-guerra.

1 Comment

  1. Que iniciativa legal das nossas diplomatas… Uma pena que este tipo de ação não tenha mais visibilidade; acho que seria muito positivo para as mulheres brasileiras ter uma visão mais clara do papel da mulher na nossa história e da presença feminina no fazer político. Certamente vou dar uma olhada neste documentário, e em seu congênere francês, e divulgar para outras mulheres interessadas na carreira diplomática!

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