Antonio Gramsci: uma bibliografia comentada

Historiador Marcus Vinícius Furtado da Silva Oliveira, especialista na vida e obra de Antonio Gramsci, apresenta cinco obras e uma coleção que ajudam a entender o pensamento do intelectual italiano.
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Livros de Gramsci são comuns em bibliotecas e livrarias. Foto: Bruno Leal.

Os primeiros trabalhos do político e intelectual Antonio Gramsci (1891-1937) começaram a ser publicados na Itália, após a morte do autor, nos anos 1940. De lá para cá, seus escritos receberam diversas edições, traduções e interpretações, fazendo de Gramsci um dos autores italianos mais lidos e citados em todo mundo.

Diante desse emaranhado de referências produzidas ao longo de quase oito décadas, trago algumas indicações, principalmente em língua portuguesa, para aqueles que se interessam em conhecer mais sobre esse grande intelectual.

Aliás, não deixe de conferir também o Especial Gramsci, do Café História TV, e o artigo “Quem tem medo de Gramsci”, publicado aqui mesmo no Café História, que, além de explicar sua vida e obra, mostra os erros e interpretações equivocadas presentes nas interpretações feitas pela extrema-direita.

GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. Civilização Brasileira, 2014.

Ao longo do tempo, os Cadernos do Cárcere, escritos na prisão por Gramsci entre 1929 e 1935, ganharam três edições na Itália. Cada edição foi feita a partir de determinados critérios editoriais e das pesquisas disponíveis em cada momento. A edição atual, conhecida como edição crítica, foi publicada pela primeira vez em 1975. É a primeira edição que procurou publicar os textos de Gramsci conforme a ordem em que foram escritos. Na década de 1980, alguns pesquisadores, como Gianni Francioni, apontaram alguns erros presentes na edição crítica. Atualmente, uma nova edição dos Cadernos do Cárcere, fruto dessas novas pesquisas, está prestes a ser publicada na Itália.

No Brasil, desde 1999, há uma edição brasileira dos Cadernos do Cárcere, publicada pela editora Civilização Brasileira com a curadoria de Carlos Nelson Coutinho, Luiz Sérgio Henriques e Marco Aurélio Nogueira. Essa edição, publicada em 6 volumes, conta com alguns dos avanços feitos nos estudos gramscianos desde os anos 1980. Além disso, o primeiro volume conta com um excelente artigo de introdução escrito por Carlos Nelson Coutinho.

VACCA, Giuseppe. Vida e pensamento de Antonio Gramsci (1926-1937). Fundação Astrojildo Pereira/Contraponto, 2012.

Fruto de uma ampla pesquisa documental, o livro de Giuseppe Vacca acompanha a trajetória política, intelectual e pessoal de Gramsci entre sua prisão, em 1926, até sua morte, em 1937. Para Vacca, acompanhar a vida de Gramsci no cárcere é fundamental para compreender seus trabalhos e seus posicionamentos políticos. Nessa análise, feita a partir de uma historicização integral, Gramsci aparece como um intelectual e político inovador, atento aos problemas de seu tempo e às principais discussões que aconteciam nos círculos marxistas e no movimento comunista internacional.

VACCA, Giuseppe. Modernidades Alternativas: o século XX de Antonio Gramsci. Fundação Astrojildo Pereira, 2016.

Pensando como uma continuação de Vida e pensamento de Antonio GramsciModernidades Alternativas explora mais minuciosamente alguns dos conceitos mais importantes dos Cadernos do Cárcere, como hegemonia e revolução passiva. Como sugerido pelo próprio título, a preocupação de Vacca é mostrar Gramsci como um intelectual capaz de oferecer caminhos para pensarmos os desafios da modernidade.

Para Vacca, esses caminhos aparecem no conceito de hegemonia. Originalmente formulado por Lenin para definir a direção de uma classe sobre outra, em Gramsci o conceito foi moldado para compreender a criação e o funcionamento do poder político na sociedade.

Em um dos pontos mais interessantes da obra, o historiador italiano demonstra como esse conceito pode ser usado para entender a política em uma era global. No mundo globalizado, a hegemonia, isto é, o poder de criar consensos e dirigir a sociedade, também se torna mundial, sendo disputado por diferentes nações ou grupos de nações. Diante dessas disputas, Gramsci afirma que qualquer tentativa de transformação da realidade precisa considerar as relações entre as nações e o mundo.

Construir um mundo mais justo e igualitário significa, nessa interpretação, criar formas cada mais internacionais de fazer política, para que os destinos das nações, cada vez mais entrelaçados ao globo, possam ser discutidos e definidos por todos.

AGGIO, Alberto; HENRIQUES, Luiz Sérgio; VACCA, Giuseppe (organizadores). Gramsci no seu tempo. Fundação Astrojildo Pereira, 2ª edição, 2019.

Em dezembro de 2007, por ocasião dos 40 anos da morte de Gramsci, foi realizado um importante congresso na cidade de Bari, na Itália. Os textos dos pesquisadores foram publicados no ano seguinte em dois volumes. Em 2010, Alberto Aggio, Luiz Sérgio e Giuseppe Vacca selecionaram e traduziram os principais textos contidos nesses dois volumes e publicaram na edição brasileira de Gramsci no seu tempo, que ganhou sua segunda edição em 2019.

A coletânea traz textos dos principais pesquisadores italianos e aborda diversos temas. Selecionados de maneira ampla, os artigos abrangem todo o período da vida intelectual e política de Gramsci, desde suas primeiras publicações no contexto da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) até suas últimas reflexões na prisão.

Por meio dos artigos, podemos situar Gramsci no seu próprio e entender como suas principais ideias foram construídas a partir de diálogos, rompimentos e inovações com a tradição marxista e comunista.

VOZA, Pasquale; LIGUORI, Guido (organizadores). Dicionário gramsciano. Boitempo/Fundação Astrojildo Pereira.

Ao longo de seu trabalho, Gramsci formulou diversos conceitos e conferiu significados específicos a alguns outros termos. Os intelectuais, por exemplo, não eram necessariamente para Gramsci pessoas eruditas ou acadêmicas. Ao contrário, é intelectual todo aquele que exerce uma função de direção cultural e política na sociedade. Por outro lado, os conceitos dos Cadernos do Cárcere, como hegemonia, são formulados e reformulados ao longo do tempo. Isso significa que o mesmo termo possui significados diferentes nos textos gramscianos.

Para enfrentar esse labirinto de especificidades e detalhes importantes, o Dicionário Gramsciano, organizado por Pasquale Voza e Guido Liguori, é uma ferramenta muito importante. Contando com mais de 600 verbetes, escritos por diferentes pesquisadores, o dicionário registra os diferentes significados assumidos pelos conceitos e suas distintas aparições ao longo dos textos gramscianos.

Coleção Escritos Gramscianos, Editora Boitempo. 3 volumes

Embora os Cadernos do Cárcere sejam a obra mais conhecida de Gramsci, há também importantes textos que foram escritos e publicados antes de sua prisão em diversos jornais italianos. Esses textos, que mostram o amadurecimento intelectual do autor, sua adesão ao comunismo e suas principais preocupações às vésperas de seu encarceramento. Publicados pela primeira vez pela Civilização Brasileira em dois volumes chamados Escritos Gramscianos, esses artigos ganharam novas edições pela Boitempo.

O primeiro volume, Odeio os indiferentes, organizado por Álvaro Bianchi e Daniela Mussi, contém os escritos de Gramsci produzidos ao longo de 1917. A escolha da data se deve ao impacto que as Revoluções Russas tiveram no pensamento de Gramsci.

O segundo, Homens ou máquinas?, organizado por Gianni Fresu, agrupa textos escritos entre 1916 e 1920. Esse período corresponde ao aprofundamento da participação de Gramsci no Partido Socialista Italiano (PSI) e no movimento operário dos Conselhos de Fábrica que, no final dos anos 1910, promoveu diversas greves em importantes fábricas italianas.

O terceiro, Os líderes e as massas, também organizado por Fresu, agrega textos elaborados entre 1921 e 1926. Nesses anos, Gramsci se engajou na fundação do Partido Comunista da Itália (PCI), aproximou-se do movimento comunista internacional e formulou suas primeiras interpretações sobre a ascensão do fascismo na Itália. Os textos de 1926 representam suas últimas produções antes de sua prisão.

Como citar esta bibliografia comentada

CLARO, Celso Fernando. A representatividade asiática na história do Oscar (Artigo). In: Café História. Disponível em: https://www.cafehistoria.com.br/a-representatividade-asiatica-na-historia-do-oscar/. ISSN: 2674-5917. Publicado em: 27 Fev. 2023.

Marcus Vinícius Furtado da Silva Oliveira

Professor de História do colégio de aplicação da Universidade Federal de Uberlândia e pós-doutorando em História pela Universidade de Brasília. É autor do livro A arquitetura fractal de Antonio Gramsci: história e política nos Cadernos do Cárcere e produtor de conteúdo no Instagram @marcusfsoliveira e no @pahistoria

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