“7 Prisioneiros”: um filme ainda necessário

Para Aline Duarte, o filme procura fazer um paralelo entre essa situação de opressão, medo e relações afetivas entre opressores e oprimidos e o nosso passado escravista.
18 de março de 2022
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O ator Christian Malheiros representa "Mateus" e contracena com Rodrigo Santoto no filme. Foto: Fotos: Aline Arruda/Divulgação.

Para um filme entrar no streaming e ter sucesso, é necessário, além de toda a estratégia de marketing e distribuição envolvida, que ele possua uma estética aproximada dos filmes que a plataforma produz, além de uma história com uma problemática universal, mas que ainda assim consiga mostrar algum tipo de peculiaridade em relação ao meio em que foi produzido. Nesse ponto, o brasileiro “7 prisioneiros” (2021), do diretor Alexandre Moratto, produzido pela O2, em parceria com Ramin Bahrani e Fernando Meirelles, cumpre bem o seu papel.

A obra, que estreou no Festival de Veneza de 2021, onde ganhou a categoria de “Melhor filme de língua estrangeira”, além de chegar a ser o 2º filme mais visto de língua não inglesa na plataforma Netflix, conta a história de  Mateus (Christian Malheiros), menino pobre do interior, que é atraído para São Paulo com outros 4 colegas – todos com nomes bíblicos: Isaac, Samuel e Ezequiel – em busca de realizar o sonho de trabalhar na capital com carteira assinada, tirando as suas famílias de situação de miséria. Rapazes ingênuos, com pouca instrução, que acreditam terem tirado a sorte grande. Porém, assim que chegam no ferro velho de Luca (Rodrigo Santoro), eles vão descobrindo que fazem parte de um esquema de trabalho escravo muito maior do que imaginam.

O roteiro do filme tem o trunfo de fazer com que o espectador vá percebendo a complexidade da situação de Mateus e seus colegas pouco a pouco, através de pequenas ações que se desenrolam entre Mateus, seu patrão e seus colegas. Se, num primeiro momento, Mateus pensa que a situação dele e dos colegas é negociável, fica muito claro para o espectador que esse não é o caso. E é na busca por essa tentativa de aproximação com o patrão para uma negociação mais segura que Mateus toma decisões que o levam a se aproximar moralmente do seu algoz, mas nunca em pé de igualdade com ele.

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“7 Prisioneiros”, filme da Netflix – Foto: Divulgação/Netflix

Aliás, o filme procura fazer um paralelo entre essa situação de opressão, medo e relações afetivas entre opressores e oprimidos e o nosso passado escravista, e é essa relação mal digerida um ponto muito positivo do filme. Destaque para as cenas de cantiga africana – o banzo – no momento em que Mateus ocupa um desses lugares dúbios na narrativa, e na qual vê seus amigos cantando trancados no dormitório enquanto ele os observa do pátio da oficina, a “casa grande” nessa dinâmica. Destaque para as atuações de Rodrigo Santoro, Christian Malheiros e Bruno Rocha, como Samuel.

Apesar de ser um filme curto que atende muito bem ao streaming, ele fala mais do Brasil do que aparentemente pretende, no passado e no presente. Fala do sonho da cidade grande em oposição ao campo, da imigração e de como as instituições governamentais se colocam diante da questão do trabalho escravo no mundo. Para expandir o debate, sugiro assistirem a “Biutiful”, de Alejandro González Iñárritu com Javier Bardem, para ver como essa questão é mostrada do ponto de vista de outro país latino. Para os amantes de história, sugiro como link possível a leitura de “Caetana diz não” de Sandra Lauderdale Graham.

Aline Duarte

Mestre em História Social da Cultura e Bacharel com Licenciatura em HIstória pela PUC Rio . Trabalhou como pesquisadora para o Arquivo Nacional, Museu da República e TV Globo. É roteirista e formada em Direção Cinematográfica pela AIC-RJ (2021). Tem como áreas de interesse: História da cidade do Rio de Janeiro e reformas urbanas, História da Educação, Formação da Identidade Política Nacional (de 1889 a 1945), Cinema, Cinema e História, roteiro e montagem, o papel e representação dos filmes e séries nos nossos dias.

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