Mestrado em História: dicas para a prova escrita

Professores e professoras que participam frequentemente de bancas de mestrado em História dão dicas para se sair bem nessa etapa da seleção.
15 de setembro de 2017
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Mestrado em história
Aproveite as dicas, confira a série completa e boa sorte! Foto: Pixabay

Universidades de todo o país começaram a publicar seus editais de mestrado acadêmico em História e em pouco tempo milhares de candidatos estarão participando de uma acirrada seleção. Pensando nisso, o Café História pública a partir de hoje uma série de matérias que visa dar dicas valiosas para cada uma das três principais etapas presentes em praticamente todo processo seletivo da área: o projeto de pesquisa, a prova escrita e a entrevista.

As dicas são dadas pelos maiores especialistas no assunto: professores e professoras universitárias que participam frequentemente das bancas de seleção. Conversamos com profissionais de diferentes estados e atuam em universidades públicas e privadas.

A série do Café História possui três partes. Começamos pela prova escrita – que diz respeito aos conteúdos de História, embora alguns professores também mencionem, em suas dicas, a prova de língua estrangeira, que também é escrita. As dicas para o projeto de pesquisa e para a entrevista serão publicadas nos dias 22 e 29 de setembro, respectivamente. Aproveite!

Renata Vereza (UFF) – Referências bibliográficas organizadas

Acho muito importante que o candidato tenha organizado quais são as referências bibliográficas que ele gostaria de usar para cada ponto, fazendo, assim, uma lista da bibliografia. Com isso, ele não se perde na hora da consulta, procurando e pensando em quais obras vai usar.

Meize Lucena Lucas (UFC) – Dialogar com os autores

A leitura de textos selecionados para provas de seleção de mestrado deve ser feita a partir de alguns elementos. Primeiro, devemos situar o autor no debate historiográfico de sua época e buscar identificar quais foram as questões relevantes naquele momento. Importante, igualmente, conseguir relacionar o texto (ou os textos) em questão com os problemas considerados centrais na área, bem como com o tratamento de fontes, narrativa, tempo, gêneros textuais, diversidade de fontes. Por fim, entenda que ler um texto é saber se apropriar dele e ter capacidade para fazê-lo dialogar com autores e questões do campo do conhecimento humano.

Bernardo Buarque de Holanda (FGV-SP) – Agrupar a bibliografia

Mais do que fichar textos em separado – tarefa importante, evidentemente –, a prova escrita para o mestrado em História requer do candidato a capacidade de agrupar a bibliografia. Trata-se de identificar e propor relações que articulem autores em um debate intelectual mais amplo, de modo a reconhecer as linhas mestras de inserção das obras na historiografia. Dito de outra forma, aferir conteúdo não basta, é preciso estabelecer pontes entre os conceitos e as correntes teóricas em exame.

Fernando Nicolazzi (UFRGS) Compreensão dos textos

Obviamente, não há fórmula pronta para ser aprovado em uma seleção de mestrado, mas creio que alguns “cuidados” mínimos podem ajudar. No caso da prova escrita, o primeiro cuidado é ler atentamente o edital para conhecer as regras do jogo e saber se há bibliografia mínima de referência ou não. Normalmente há, e este é um ponto importante: o que fazer com ela? De modo geral, a bibliografia pode indicar o perfil das linhas de pesquisa do programa ou apontar uma série de conhecimentos prévios necessários para o ingresso na pós-graduação. No primeiro caso, é fundamental conhecer bem o programa e os professores e professoras que fazem parte dele, procurando indicar, na prova, em que medida a pesquisa proposta se adéqua a tal perfil. No segundo, penso ser importante demonstrar a capacidade de compreensão dos textos e como eles podem ser utilizados no fazer historiográfico. Em ambos os casos, convém sempre estabelecer relações com o projeto de pesquisa, embora isso tenha que ser muito bem pensado, para não parecer algo meramente artificial e forçado, ou seja, tentar adaptar conceitos, perspectivas ou autores que não dialogam diretamente com o projeto, apenas para demonstrar que leu os textos: a seleção adequada da bibliografia a ser usada faz parte do ofício. Por fim, é imprescindível elaborar um texto bem estruturado, com clareza na construção do argumento principal: como o tempo de escrita é limitado, parágrafos não muito extensos ajudam a manter uma linha coerente de raciocínio. Por mais óbvio que pareça, o texto precisa ter começo, meio e fim, e esses três elementos devem dialogar entre si. Virtuoses ensaísticas podem ser deixadas para a escrita da dissertação, após ter ingressado no mestrado.

Flávio Edler Coelho (FIOCRUZ) – Proficiência na escrita

Uma dica relevante é realizar a leitura da literatura proposta pelo Programa de Pós-Graduação, imaginando questões que possam articulá-la. É preciso ainda demonstrar proficiência na escrita, revelando pontos de aproximação ou diferenças entre a abordagem de cada autor. Ao apresentar seu ponto de vista, fundamente-o em relação à literatura pertinente.

Gian Carlo (UFAL) – Uso da bibliografia e concisão

Toda seleção tem questões de provas baseadas na bibliografia que consta no edital. Quem for se submeter a uma prova de mestrado deve ter o conhecimento das leituras exigidas e conseguir articular, na sua resposta, os autores, mostrando suas contribuições ao questionamento proposto. Na hora da prova, nada depressa. Leia atentamente o que se quer, faça um roteiro com início, meio e fim. O candidato pode – e, se achar pertinente, deve – usar outros autores que conhece para complementar, contextualizar e enriquecer sua resposta. Evite encher páginas e páginas com elucubrações, você pode se perder. Melhor ser conciso e ter precisão no que vai falar. Uma dica final é: na introdução da sua questão, diga o que vai fazer e quais autores irá usar. Assim, o avaliador já terá um roteiro, e você também pode justificar o motivo de usar o autor X e não y, evitando questionamento na avaliação.

André Lemos Freixo (UFOP)Leitura do Edital e argumentação

Bom, partindo da minha experiência, isto é, a partir do meu Programa de Pós-Graduação, as etapas com provas escritas são, em geral, duas: a etapa das perguntas referentes às linhas de pesquisa e às referências bibliográficas apresentadas no edital que rege o processo seletivo, e a prova de proficiência em língua estrangeira. Creio que qualquer processo de seleção ao nível de Pós-graduação essas duas etapas se fazem presentes. São momentos distintos e os pesos (para cômputo da média final do(a) candidato(a)) também variam de programa para programa. São momentos de grande nervosismo e muita ansiedade dos candidatos. Não gostaria de soar antiético, mas creio que as(os) candidatos(as) devem ter em mente que estas etapas (as escritas) avaliam, em parte, a qualidade de sua leitura, interpretação e redação. Avalia-se também suas competências para responder ao que foi perguntado, sua fluência e grau de aprofundamento nas referências indicadas, sua capacidade para argumentação, se trouxe ou não mais referências com as quais procura dialogar. Isso tudo em uma situação pouco confortável. Pode parecer óbvio, mas professores(as) sabem que isso é muito importante não apenas para o ingresso, mas igualmente para a banca ter uma ideia do desempenho do(a) candidato(a) caso seja aprovado e se matricule no Programa. É disso que se trata, ao final das contas. Avaliar as condições do(a) candidato(a) de ingressar em um Programa de Pós-Graduação.

Tenho cinco “dicas” gerais: 1) Leia o edital. Leia várias vezes o edital. Chegue no dia ao local de prova com o edital perfeitamente compreendido e siga-o religiosamente. Em caso de dúvida, pergunte ao fiscal ou aos membros da banca; 2) Responda ao que foi solicitado. Em geral, provas desta natureza consistem em duas perguntas, uma mais geral, sobre algum autor das referências presentes no edital, e outra sobre sua pesquisa, o projeto, ou sobre o como seu projeto pode figurar na linha selecionada; 3) Leia os textos da bibliografia da linha selecionada (caso se aplique). Fiche-os, resuma-os, pense com eles e a partir deles o seu projeto. Demonstre isso na prova escrita. É importante lembrar que estas referências não estão ali gratuitamente. São referências para um ou mais professores que orientam na linha de pesquisa selecionada – logo, interessam a você diretamente; 4) Faça uma pesquisa dos textos publicados pelos docentes da linha de pesquisa escolhida. Dialogue de modo apropriado com os mesmos na sua prova escrita. Se estes não figurarem nas referências disponíveis no edital, melhor ainda; 5) Para a prova de proficiência em língua estrangeira, não há muito o que dizer, pois varia muito de programa para programa o modo como os(as) candidatos(as) são avaliadas(os). Mas, caso o edital (que a esta altura você já leu e releu!) permita a consulta a dicionários de idiomas, tenha sempre em mente dicionários na mesma língua, nunca dicionários bilíngues. Por exemplo, se sua opção for para proficiência em língua inglesa, o dicionário que você deverá consultar deverá ser inglês/inglês, jamais inglês/português. Evite constrangimentos desnecessários. Nunca tente “passar a perna” na banca ou “dar uma de João-sem-braço”, como dizem por aí. No mais, creio que sigo o clichê: reserve o dia anterior à prova para relaxar, dar um passeio, ir ao cinema, à praia, ao parque, etc. Na hora da prova, em geral, de quatro horas, leve um pequeno lanche para comer quando sentir necessidade e uma garrafinha de água. Dizem que a sorte sempre sorri para os preparados, de modo que… preparem-se! E boa sorte!

Bruno Leal

Fundador e editor do Café História. É professor adjunto de História Contemporânea do Departamento de História da Universidade de Brasília (UnB). Doutor em História Social. Tem pós-doutorado em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pesquisa História Pública, História Digital e Divulgação Científica. Também desenvolve pesquisas sobre crimes nazistas e justiça no pós-guerra.

18 Comments

  1. Muito bom! Um serviço de utilidade pública que certamente vai auxiliar muitos candidatos a mestrandos nesse momento tão importante de sua trajetória acadêmica. Aguardo as próximas postagens da série. Curti, Bruno!

    • Oi, Jane. Em breve vamos fazer um voltado para o mestrado profissional, que é, a propósito, tema recorrente aqui no Café História. Cada especial demanda muito trabalho. Por isso, vamos aos poucos. Em breve, teremos novidade. Abraço!

  2. Dicas excelentes!!!
    Tenho certeza que vai ajudar os candidatos que irão concorrer ao curso de mestrado. Vou ficar atento quando for postular uma vaga ao mestrado.

  3. Informações valiosas para quem pretende concorrer as vagas de Mestrado em História nas universidades, mas um grande serviço de alta qualidade do Café História, com a orientação do professor Bruno, que dispensa comentários por sua competência e capacidade intelectual para organizar estes assuntos.

  4. Bom dia Bruno.
    Parabéns pelas dicas e orientações. É mais uma vez fico frustrado com as dificuldades que encontro. Nenhuma universidade se interessa ou está disposta a aceitar um candidato ao mestrado de História com 74 anos. As respostas mais idiotas são as que ouço… É meu grande sonho começa a morrer. É uma pena terem me negado esse direito.
    Desculpe a queixa de alguém que fez muito pela história regional e ainda continua. Mas precisava falar.
    Muito sucesso para você.
    Dagoberto Mebius
    http//independent.Academia.edu/DagobertoMebius.

    • Olá, Dagoberto. Obrigado por escrever. Poxa, lamento demais que você esteja encontrando dificuldades. Mas eu custo a crer que uma universidade rejeite qualquer candidato por causa da idade. Não só pela questão ética, mas porque boa parte das fases da seleção são às escuras. Será que não há alguma fragilidade no seu projeto que esteja te impedindo a aprovação? Grande abraço!

      • Olá Bruno. História da Educação sempre foi a minha “cachaça”, até cheguei a conseguir uma vaga como aluno especial de mestrado na UNISO, Universidade de Sorocaba algum tempo atrás. Como aluno especial representei a Universidade e professores do mestrado na 3o. Congresso Brasileiro de História da Educação, na PUC -Curitiba em 2004. Apresentei um dos temas mais que mais conheço, “O Collegio do Lageado de Campo Largo da Villa de Sorocaba”. Quando voltei… aconteceu a ruptura com esses professores e acabei por deixar a Universidade. É o mais interessante que fiz inúmeras palestras sobre o assunto e é um dos temas mais acessado na Academia.edu – cerca de 6 mil acessos.
        Fora isso a minha Cartilha de História de Sorocaba foi editada durante 7 anos com mais de 25 mil exemplares.
        O que será que está errado?
        Eu tenho esse sonho e desejo de ser mestre em minha área. Desculpe o desabafo. Abraços.
        Dagoberto Mebius

        • Imagina, Dagoberto. Bom, eu continuo achando que o fator idade não é motivo para você não conseguir entrar no mestrado. Tente conversar com algum professor (possível orientador) sobre o seu projeto. Projetos de mestrado tem um approaching diferente de outros trabalhos de história. A questão do problema, do recorte do objeto, etc, tudo isso é decisivo. Boa sorte!

    • Oi, Hiliquias. Tudo bem? Então, cada mestrado possui local e valores próprios.
      Na época de cada seleção, fique de olho na publicação dos editais. Abraço!

  5. Muito obrigado pelas valiosas dicas. Me acomodei ao termino da minha graduação e só agora estou pensando seriamente em um projeto de mestrado.

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