História Pública, Digital e Divulgação de História foram temas de evento inédito realizado na UFRJ

8 de julho de 2017

“Radar” reuniu profissionais de diversos campos do conhecimento para apresentar iniciativas e projetos em andamento.

Por Ana Paula Tavares | Agência Café História

“Basicamente, eu produzo mapas”. Com essas palavras o estudante de geografia da Universidade de São Paulo (USP), Hugo Nicolau Barbosa Gusmão, finalizou a sua fala na quinta-feira, dia 29 de junho, segundo dia do “Radar”, evento interdisciplinar que ocorreu no Salão Nobre do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ, promovido pelo Programa de Pós-Graduação em História Social (PPGHIS).

Radar - HIstória Digital
Primeira mesa do dia 29 de junho. Da esquerda para a direita: Angela Bettencourt, Bruno Leal, Hugo Nicolau e Carolina Ferro. Foto: Ana Paula Tavares.

O trabalho de Gusmão, no entanto, nada tem de básico. O estudante de geografia, autor do blog “Desigualdades Espaciais”, tem se destacado nos últimos anos na elaboração de mapas digitais sobre as desigualdades sociais no Brasil, utilizando para isso o software QGIZ. O seu premiado trabalho, com reconhecimento internacional, inspirou historiadores presentes no “Radar” a repensarem o lugar dos mapas no ensino, na pesquisa e na divulgação de história. Mas esse é só um dos destaques que ocorreram no evento.

“Ciência que não se vê, não existe”

O “Radar” ocorreu nos dias 28 e 29 de junho. Contou com quatro mesas, duas em cada dia (programação abaixo). Na mesa “Manoel Salgado”, Juniele Rabêlo, professora do Instituto de História da UFF, discutiu a recente história da História Pública no Brasil, focando nos múltiplos conceitos de “público”.  A mesa também contou com a participação de Alexandre Morelli, da Fundação Getúlio Vargas, que sublinhou o fenômeno conhecido como “Big Data”, isto é, a produção de um grande volume de informações na sociedade contemporânea, e discutiu como a tecnologia vem sendo utilizada para desclassificar documentos sigilosos.[1]

DIA 28 DE JUNHO DE 2017
MESA MANOEL SALGADO | 14:00 – 16:00
Ricardo Pimenta IBICT/UFRJ Informação e vigilância: um novo projeto de Humanidades Digitais em curso.
Juniele Rabêlo UFF História Pública no Brasil: compartilhamentos.
Alexandre Moreli FGV Expandindo horizontes e solucionando impasses. Mineração de dados e a História das Relações Internacionais.
MESA ROY ROSENZWEIG | 16:30 – 18:30
Julio Silveira Ímã Editorial História Colaborativas. Casos @Rio365 e @Rio450.
Thiago Gomide Tá na História Jornalismo e História podem caminhar juntos?
Roberta Cerqueira Revista Manguinhos  Periódicos científicos de história e mídias sociais: a experiência da revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos.
DIA 29 DE JUNHO DE 2017
MESA BORIS FAUSTO | 14:00 – 16:00
Carolina Ferro Unicarioca/RHBN A experiência da Revista de História da Biblioteca Nacional e a divulgação científica para não especialistas.
Hugo Nicolau Desigualdades Espaciais As desigualdades fizeram-se presentes: a importância de espacializar as desigualdades sociais.
Angela Bettencourt Biblioteca Nacional A Hemeroteca Digital revelando o rascunho de nossa história.
MESA ROBERT KELLEY | 16:30 – 18:30
Bruno Leal Café História  Café História: divulgação da História na internet.
Daniel Carvalho Sobre História Podcast Ensino de História e o historiador nos espaços públicos.
Paulo César Gomes História da Ditadura  História da Ditadura: entre a academia e o grande público.

A segunda mesa do dia, “Roy Rosenzweig”, foi aberta com a fala do editor Julio Silveira, que explorou a relação entre História e Instagram, contemplada em seus projetos @Rio450 e @Rio365 – nos quais ele conta que a população carioca se envolveu elaborando histórias e memórias sobre a cidade do Rio de Janeiro. Em seguida, Thiago Gomide, do Tá na História, falou sobre o rápido crescimento das mídias sociais e sobre como o jornalismo, desde que comprometido com valores éticos, pode contribuir para levar a História ao grande público, especialmente através de novas mídias como o Youtube. Encerrando a mesa, Roberta Cerqueira, da revista Manguinhos, da Fiocruz, contou o caso de sucesso de divulgação da revista – uma das mais bem-conceituadas do país – nas redes sociais. Cerqueira destacou como esses espaços são hoje importantes para as métricas das revistas científicas e relatou diversas estratégias que podem ser usadas para a divulgação da História em mídias sociais. Uma dessas estratégias é acionar influenciadores que colaboram com a divulgação. Em geral, podem ser professores da área, outras instituições de pesquisa sobre o tema ou os próprios autores. Mas Cerqueira citou também o caso de um tweet da Manguinhos que fez grande sucesso ao ser respondido pela banda Nação Zumbi – e gerou um pico de acesso ao artigo que mencionava o manguebeat. A historiadora encerrou sua apresentação com uma frase que é lema da plataforma Redalyc e que acabou se tornando a essência desta primeira edição do “Radar”: “Ciência que não se vê, não existe”.

História e Internet

Carolina Ferro, professora da Unicarioca e ex-Revista de História da Biblioteca Nacional (RHBN), abriu o segundo dia de evento, na mesa “Boris Fausto”. Dentre outras questões, Ferro falou sobre os desafios que ela e sua equipe da Revista enfrentaram no campo da divulgação científica, como, por exemplo, o relacionamento nem sempre fácil com os autores e as dificuldades financeiras enfrentadas pela publicação em seus últimos anos. A professora sublinhou que embora muitos acadêmicos tenham se envolvido na campanha contra o fim da revista, este apoio, de um modo geral, ficou aquém do esperado. E também comentou sobre seu novo projeto na área: ela é editora da Revista do Arquivo Público do Rio de Janeiro.  Nesta mesa ainda se apresentaram o estudante de geografia Hugo Nicolau e Angela Bettencourt, coordenadora da Biblioteca Nacional Digital. Bettencourt destacou o grande sucesso alcançado pela Hemeroteca Digital, projeto que, segundo ela, possui mais de 128 mil acessos por dia.

A última mesa do evento, “Robert Kelley”, foi dedicada a projetos que combinam internet e História. Daniel Carvalho falou sobre a tríade ensino de história – história pública  – história digital no desenvolvimento do seu projeto coletivo, o podcast  Sobre História, que tem uma média de 12.000 ouvintes por programa. Carvalho apresentou algumas das reflexões que embasaram sua dissertação “Espaços públicos, saberes públicos: um podcast como espaço de ensino de História”. Já Paulo César Gomes, falou sobre o site História da Ditadura, lançado em parceria com o historiador Pedro Teixeirense em setembro de 2016. Gomes, especialista em ditadura, disse que tem estudado princípios de comunicação e marketing e que estes têm sido extremamente importantes no desenvolvimento de estratégias de divulgação da História. Por fim, Bruno Leal encerrou o evento explicando os fatores que o levaram a trocar o Ning pelo WordPress no desenvolvimento do Café História, que está próximo de completar 10 anos no ar. Obsolescência tecnológica, dificuldades de moderação e esgotamento do modelo de rede social estão entre os motivos.

Parcerias e outros resultados

Mais de 60 pessoas estiveram presentes nos dois dias do encontro. São bibliotecários, arquivistas, historiadores, jornalistas, museólogos e outros interessados nos debates envolvendo História e o seu caráter público. Todos os presentes vão receber certificados de ouvintes. Além do sucesso de público, vale destacar duas boas notícias que podem ser concretizadas em breve. Angela Bettencourt, da Biblioteca Nacional, sinalizou a Carolina Ferro a possibilidade de digitalizar e disponibilizar todo o acervo da RHBN na Hemeroteca Digital gratuitamente – atualmente, nem mesmo o site da revista está no ar. Ferro, por sua vez, abriu a possibilidade de parceria da Unicarioca com o podcast Sobre História, o que possibilitaria uso do estúdio da universidade e otimização do trabalho de produção.

Se a ideia do “Radar” era fazer visível ideias e principalmente projetos em história digital, pública e divulgação de história, tudo sugere que o evento concluiu sua primeira edição com um saldo bastante positivo e com boas ideias para a segunda edição, prevista para 2018.

[1] Devido a problemas pessoais, Ricardo Pimenta (IBICT/UFRJ) não pôde comparecer ao evento.


Como citar essa notícia

TEIXEIRA, Ana Paula Tavares. História Pública, Digital e Divulgação de História foram temas de evento inédito realizado no Brasil (Notícia). In: Café História – história feita com cliques. Disponível em: https://www.cafehistoria.com.br/evento-radar-ufrj. Publicado em: 7 Jul 2017. Acesso: [informar data].

Bruno Leal

Fundador e editor do Café História. É professor adjunto de História Contemporânea do Departamento de História da Universidade de Brasília (UnB). Doutor em História Social. Tem pós-doutorado em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pesquisa História Pública, História Digital e Divulgação Científica. Também desenvolve pesquisas sobre crimes nazistas e justiça no pós-guerra.

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